Tinha de passar o tempo em São Bento enquanto esperava a chegada pachorrenta dos comboios. Uma feira do livro? sim! e perdido entre os esquecidos livros em promoção, com pó e abandono qb, lá estava esta estória, dobrada e suja,anciã mas bem viva! Trouxe-o comigo e aqui o partilho com voçês. Não sei a data mas parece-me um livro pós 25 de Abril. entre 75 e 80.
"Era uma vez uma ilha. Como é natural, nessa ilha havia meninos que andavam na escola. A professora vinha todas as segundas-feiras no barco e ia embora novamente ao sábado.
A professora falava, falava, falava...os meninos escreviam, escreviam, escreviam...
Todos eram bons e ficavam quietos e calados, sentados cada um no seu lugar.
Certo dia o mar cresceu e veio uma tremenda tempestade. O barco não chegou e os meninos ficaram sem professora. Não havia quem ditasse, quem mandasse fazer as contas, quem os mandasse portar-se bem, sentados cada um no seu lugar a obedecer às ordens.
Uma escola onde não se faziam essas coisas, que escola era essa?
Se não era uma escola, já não era preciso estar quietos, sentados cada um no seu lugar... se não havia quem mandasse,podia-se fazer tudo o que se quisesse!
As pesoas estavam habituadas a passar diante da escola e a não ligar, mas naquele dia pararam a fazer comentários.
- já se sabe que os miúdos não podem ficar sozinhos.
-Sozinhos só fazem barulho!
-São muito pequenos.
-Mesmo que fossem crescidos...
-Os estudantes do liceu são crescidos e quando querem fazer as coisas sozinhos só fazem barulho.
-Por este andar, onde se vai parar?
As pessoas que diziam estas coisas recordavam-se do tempo em que eram pequenas e andavam na escola.
Também no tempo delas era preciso portar-se bem e estar quietos no lugar, ouvir os professores, obedecer, escrever, escrever e escrever...
Nenhuma delas era capaz de imaginar uma escola diferente.
Um grupo de meninos, passado um tempo, cansou-se daquela barulheira e confusão. Era aborrecido estar sentados e quietos, cada um no seu lugar, mas não era muito mais divertida toda aquela balbúrdia.
Começaram então a desenhar. Desenharam a sua ilha!
A pouco e pouco, outros meninos deixaram de se bater, de gritar, de andar a correr uns atrás dos outros e pararam a olhar para o desenho.
Um deles disse:
-Eu punha lá mais árvores!
e outro:
-Não se vêem as casas...
E outro ainda:
-Ficava bem um barco no mar.
-Não, porque está tempestade.
-Podemos também imaginar o mar calmo.
-Mas se assim é, vem a professora!
-Pensaremos nisso depois!
Nessa altura deixaram todos de fazer barulho, sentaram-se, mas não ficaram calados cada um no seu lugar. Começaram a discutir entre eles a meneira de, todos juntos, fazerem um desenho.
Decidiram desenhar toda a gente na ilha.E fizeram um grande desenho!
O desenho saiu mesmo bem.
Era tão bonito que os meninos e meninas pensaram que era uma pena serem só eles a vê-lo.
Saíram da escola todos juntos e foram afixá-lo na parede da câmara municipal.
-São de categoria!
-Fizeram tudo sozinhos!
-Mas...
-Quem diria!
Os meninos decidiram que podiam trabalhar assim todos os dias.
No dia seguinte, voltaram a discutir entre eles e decidiram trabalhar em grupo.
Um grupo escreveu uma estória.
Um outro grupo decidiu começar a construir um barco. Mas como era um trabalho difícil construir um barco pediram ajuda aos carpinteiros e aos pescadores.
A escola já não era a mesma!
Estava cheia de gente alegre!
Havia barulho, já não eram obrigados a estar quietos e sentados cada um no seu lugar. Todos trabalhavam.
Depois...um dia... o mar acalmou e a professora chegou!
Pensava ela:
-O que terá acontecido?
A professora encontrou a escola transformada. Compreendeu que o seu trabalho já não podia ser ditar, falar e obrigar as meninas e meninos a estar sentados e calados cada um no seu lugar. Era melhor trabalhar com eles e as pessoas da ilha.
E, para começar, a professora pôs a secretária de lado.
Numa escola onde ninguém era obrigado, a secretária tornara-se embaraçante e inútil.
Passado pouco tempo, de outro barco desembarcou o director.
Ele não gostava que os meninos e meninas trabalhassem com vontade, juntamente com a professora e com a gente da ilha, e que falassem e se mexessem livremente. Queria toda a gente quieta e calada no seu lugar.
E expulsou a professora!
As pessoas começaram a protestar. Diziam:
-São os nossos filhos que vão à escola. Queremos ser nós a decidir oque se faz lá dentro!
-A escola é nossa!
-Não à escola autoritária!
-Queremos uma escola livre!
-Não à escola do Blá, blá, blá!
Mas o director não queria abdicar da sua autoridade. E veio a polícia para defender a autoridade do director.
Nao vamos dizer-vos como é que a estória acabou.
Como a acabaríeis vós?"
A cargo do grupo redactorial "io e gli altri", tradução de antónio josé massano, ulmeiro editora.
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Ó único que não tem lugar nesta estória é o director, pois não entendeu a necessidade de "remar a favor da maré".
ResponderEliminarMuita gente no nosso país deveria ler esta estória/metáfora, parar para repensar o ensino que, infelizmente, ainda temos.